segunda-feira, 8 de abril de 2013

► CORPO OCO [texto]

Não sei se o reflexo neste espelho sou eu, tudo é tão diferente agora, eu estou diferente agora... Ele me fez assim.
E meu cabelo? Oque houve com meu cabelo? Está tão... tão sujo, feio, maltratado. Minha pele, tão pálida e seca.
Essa voz?! Oque é essa voz? Por que grita comigo? Cale a boca! Quem é você? Oque eu te fiz? Me deixe em paz.
Eu era tão linda, todos me desejavam, me queriam, jogavam-se aos meus pés e se arrastavam por mim, me veneravam, me bajulavam, me adulavam. Eu era ovacionada onde quer que fosse.
Eu fui maravilhosa, impiedosa, corajosa, impetuosa, arrogante e petulante.
O que vejo agora no espelho é apenas mais uma mulherzinha, uma qualquer, uma dona de casa frustrada, uma executiva fracassada, enfim, humilhada.
Meu orgulho, meu egoísmo, minha ira e meu ódio me destruíram, sim, eles me destruíram. Hoje, sou apenas alguém que sofre, sou resto, sou dejeto e realmente nada mais. Meu peito está oco, na verdade meu corpo está oco, ouço o eco da minha dor e solidão. Coisas que eu acreditava, mostraram-se ser apenas o início do problema e, a cada instante, segundo e hora que passa esse vazio me consome e me corrói por dentro.
Minha fraquezas foram reveladas, meu rosto está à mercê de quem queria cortá-lo, minha pele morta está sensível a qualquer forma de carinho e, tudo que temo agora é que aqueles a quem ferí, me perdoem.
Não há humilhação pior do que o perdão daqueles que esperamos que nos agridam e nos machuquem, assim como eu mesma já fiz.
Para meu desespero e agonia, ainda existem pessoas dispostas a perdoar, a oferecer a outra face. Só a mera menção dessa possibilidade já me enoja, desprezo todos que venham a pensar na opção do perdão.
Não pedi nada à vocês, pobres desgraçados! Não destruam meu mundo, ou o pouco que dele restou, me deixem em paz com minha soberba, me deixem alimentar minha ira e meu doce egoísmo. Se quiserem provar o sabor açucarado de meu veneno destilado de mágoas, não precisa muito, é só virem até mim, pobres desgraçados, mortos de fome.
Ainda possuo um resquício de beleza, oque vem a abastecer minha soberba, não tenho vergonha da minha supremacia afinal, é nela que apóio minha soberania.
Humildade me causa asco, fiquem vocês, miseráveis, com suas ambições por um mundo de igualdade. Podem ficar aí mesmo, parem de avançar salivando no meu sucesso, no meu brilho e no meu brilho e no meu império.
De mim vocês não terão nem o sentimento de pena, não me implorem misericórdia. O que é isso? Limpem seus ouvidos imundos, sujos de palavras ternas e ouçam bem: para mim, vocês todos são nada!

Autor: Cláudio Nanti
texto escrito em 18.Nov.2005

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